O ex-preparador físico da seleção brasileira de basquete feminino Diego Falcão afirmou à Comissão de Esporte (CEsp) , durante audiência pública nesta quarta-feira (4), que o seu desligamento em junho foi motivado por intolerância ideológica. Ele atribuiu o atrito a uma publicação contra o aborto feita por ele em redes sociais.
A reunião atendeu a requerimento ( REQ 11/2024-CEsp ) do senador Eduardo Girão (Novo-CE), que presidiu a audiência. Girão lamentou a ausência do presidente da Confederação Brasileira de Basquete (CBB), Guy Peixoto Júnior.
Segundo Diego Falcão, a diretora do basquete feminino, Roseli do Carmo Gustavo, afirmou que “não havia mais clima” para a continuidade dos trabalhos dele após a reação negativa de jogadoras da seleção à sua publicação. O conteúdo publicado era favorável ao PL 1.904/2024 , projeto de lei que equipara a pena para a interrupção da gestação acima de 22 semanas à de homicídio (20 anos de prisão).
— Depois que fiz esse post, começaram a chegar muitas mensagens de pessoas que eu não conhecia falando de forma agressiva comigo. Neto [então técnico da seleção] recebeu uma ligação dizendo que (...) o que eu tinha postado tinha deixado as atletas indignadas. No sábado à noite, Roseli me ligou para confirmar meu afastamento. Perguntei: “Então você está me demitindo pelo post que fiz?”. Ela respondeu: “É, não existe mais clima para você trabalhar com elas”. Eu sempre falei sobre a pró-vida... Eu exerci o mesmo poder que as atletas também exercem: elas fizeram a opinião delas. Isso vai ser uma intolerância religiosa — disse ele, que é católico.
O profissional também criticou alguns sites da internet que, segundo ele, tratam de basquete feminino com uma abordagem “ideológica” e influenciam as atletas nas críticas direcionadas a ele.
Girão leu nota enviada pela Confederação Brasileira de Basquete à comissão sobre os compromissos da entidade com o tratamento sem preconceitos e sobre a possibilidade de alteração na comissão técnica “por diversos motivos, incluindo aspectos técnicos”. O texto não explicitou a razão do desligamento de Falcão. Para o senador, o motivo da demissão foi o posicionamento do preparador físico.
— É lindo o estatuto da CBB. Mas me parece que não foi cumprido o que está aqui [no estatuto]… Ele não foi demitido por questões de performance, mas por um post em seu próprio Instagram… Parece se tratar de perseguição mesmo, por opinião de caráter moral e religioso — disse o senador.
Segundo o ex-técnico da seleção José Alves dos Santos Neto, ele e o restante da equipe técnica se desligaram após a saída de Diego Falcão. Neto, que trabalha com Falcão há 17 anos e estava com ele na seleção feminina desde 2019, afirmou que saiu por solidariedade e por compartilhar dos mesmos princípios do preparador físico.
— Eu saí por uma decisão minha, em um momento muito duro. Logo depois, toda a minha comissão técnica também abriu mão. As nossas atitudes com elas sempre foram as melhores… Nós aceitamos tudo até agora, as diferenças, trabalhamos e convivemos juntos com isso. Agora, eu não posso aceitar que exista essa imposição de que o Diego tem de estar fora.
Ele também afirmou que o presidente da CBB, Guy Peixoto, foi pressionado a permitir a demissão de Diego.
— [Guy Peixoto] honrou até pouco tempo o compromisso de me dar o que eu precisava para gerir o basquete feminino. E, numa pressão que fizeram, ele permitiu que tirassem o Diego sem a minha autorização ou concordância.
O deputado distrital Thiago Manzoni (PL) criticou a decisão da CBB, argumentando que se ignorou a evolução no desempenho do basquete feminino sob a gestão da equipe de Neto.
— A culturawoke, denominada falsamente de progressismo, é uma minoria bem pequena, mas (...) é muito barulhenta. Olha o que eles foram capazes de fazer com dois profissionais super vitoriosos. Eles fizeram a CBB ignorar resultados desportivos que não viam há décadas por conta de uma postagem que confrontou essa cultura.
Para o representante do Instituto Livre Mercado, Rodrigo Saraiva Marinho, a reação das atletas atenta contra a liberdade de expressão de Diego Falcão.
— A liberdade de expressão não foi feita para eu falar o que agrada. Alguém usar a liberdade de expressão só para ouvir o que gosta... Que liberdade de expressão é essa? Tenho de ouvir algo que eu repudio — questionou.
A CEsp aprovou em julho o PL 5.004/2020 , do senador Romário (PL-RJ), que proíbe a aplicação de penas pelo exercício da liberdade de expressão no âmbito das entidades e da justiça desportiva. O objetivo do texto, relatado pela senadora Leila Barros (PDT-DF), é preservar o direito dos atletas e de qualquer pessoa submetida a uma entidade esportiva. Agora, esse projeto tramita na Comissão de Defesa da Democracia (CDD) .